Em meados de 2020, as primeiras notícias que chegaram anunciaram uma epidemia (várias vítimas de uma doença num curto intervalo de tempo, em determinadas regiões), não tardou muito para que a OMS-Organização Mundial de Saúde declarasse a situação correspondente ao Coronavírus, como pandemia (a doença se espalhou de forma descontrolada por vários continentes).
“Medo” é a palavra que mais se faz presente desde então, medo de sair, medo do contato com as pessoas, medo de não mais ver os amigos e entes queridos, medo da vida não voltar ao “normal”, medo de adoecer, medo das sequelas, medo de morrer e tantos outros medos. Ao saber que um vírus invisível e devastador está por toda parte, até quem não quis ou não quer acreditar na existência e agressividade dele, por não ter sofrido a positivação da doença, em algum momento no decorrer desse 1 (um) ano teve conhecimento de alguns danos causados; haja visto que se o vírus não adoeceu fisicamente alguém, adoeceu psiquicamente muitos. Por isso, vou sintetizar o que é doença segundo os Manuais de Diagnósticos da OMS-CID X e DSM, para que possa ser considerado doença deve haver um conjunto de sintomas que gerem prejuízo funcional e sofrimento destrutivo, ou seja, atrapalhar a vida da pessoa em diferentes áreas. O adoecer psíquico, vamos entender como a dificuldade ou incapacidade de cada um lidar com as próprias emoções e sentimentos.
Além do medo outra palavra que se faz muito presente é “luto”, que não se caracteriza como um transtorno, mas é uma condição clínica que requer atenção de um profissional; num cenário de tantas perdas, a ruptura de tantas vidas, seja de pessoas próximas, conhecidas ou não, a situação atual infere que o País vive enlutado, causa não única, porém muito atual da angústia.
Uma série de medidas foram e continuam sendo tomadas a fim de evitar a propagação da contaminação, dentre elas estão: as máscaras, o álcool em gel, o distanciamento social e por fim a vacina; armas que estão sendo usadas no combate ao inimigo invisível, só que à medida que a necessidade de usar esse armamento se estende, danos de ordem psíquica passam a ser contabilizados. O medo do adoecimento já não é somente físico e, além do mais os diagnósticos foram popularizados ou banalizados. O estresse, a impaciência, a tristeza que assola aqueles que estão limitados à solidão do home-office, das atividades diárias, sugerem sentimentos de desvalia, de desmotivação, de inquietude, de vazio e erroneamente muitas pessoas se autodiagnosticam com depressão; a incompreensão daqueles que não aderem às medidas de segurança despertam alternância no estado de humor entre euforia e depressão sendo confundido com um quadro de transtorno bipolar; o “novo normal” ainda não é o suficiente para muitos que esperam poder voltar a viver como antes, a expectativa pela vacina como sinal verde de uma retomada tem feito com que muitos se julguem ansiosos e acomodem-se nesse novo jeito de ser; as pessoas sentem muita falta da coletividade ao passo que também temem não mais saberem se relacionar; conflitos existenciais mais do que nunca se evidenciam no consultório, quando mediante tantas mudanças a sensação de incapacidade de enfrentá-las/superá-las/acompanhá-las é de tamanha intensidade; a cervejinha do happy hour que agora adentrou muitos lares como companhia ou distração frequente, levanta questionamentos sobre até onde é uso, abuso ou dependência.
Assim, venho por finalizar o bate papo deste mês, esclarecendo que nem toda angústia, aumento de peso, desânimo, impulsividade, inquietude, introspecção, medo, sofrimento, tristeza etc, caracterizam patologias mentais quando aparecem de formas isoladas, mas sim, podem evoluir; inclusive para transtornos de somatização (quando aparece algo no corpo sem detecção em exames).
O papel do psicólogo não é patologizar através dos sintomas relatados, mas é de suma importância, principalmente neste momento pandêmico que ao perceber-se num quadro de sofrimento contínuo, que ao ter prejuízos significativos no que antes lhe era muito fácil ou acessível, possa-se deixar a resistência de lado e contar com a ajuda profissional para diferenciar o que são situações normais e encontrar meios de vivenciá-las da forma mais saudável possível, entendendo saudável como funcional e, a partir daí tratar em face do conjunto de sintomas verbalizados ou somatizados o que pede um diagnóstico. É fato que o medo de ir ao consultório, clínica, hospital, laboratório, atualmente também imprimi em muitos a dúvida dos riscos a que estarão expostos, mas lembre-se que a telemedicina tem dado muito certo e que, no mais os espaços de saúde que já aderiram ao atendimento presencial estão trabalhando com muito rigor na preservação da qualidade do atendimento sem infringir as medidas de segurança. Mente e corpo caminham juntos, portanto, estejam atentos aos sinais indicativos de que você precisa e pode contar com a ajuda de um profissional da área da psicologia (adoecimento psíquico) ou da área médica (adoecimento físico).