Não sei onde estou indo, mas sei que estou no meu caminho!

Por Cadernos de Rishikesh - Nei Silva em 26/03/2021
Não sei onde estou indo, mas sei que estou no meu caminho!

Boto o pé na Índia, ou quase, pois antes assisto a forte arremetida do avião em Delhi, e as justificativas do comandante, "tentamos descer, mas a visibilidade baixou a zero e não conseguimos, vamos aguardar um pouco, procurar opções, assim que definirmos o que fazer, avisaremos!" Eu agradeço se você me avisar o que devo fazer", pensei rindo. Este foi, talvez, o primeiro teste, a primeira Lição de casa que tomo nesta, digamos jornada que comecei não sei quando, rumo a não sei direito a que, sem saber direito também o porquê. Ou como diz a música do Raul Seixas " Não sei onde de estou indo, mas sei que estou no meu caminho!".

Este caminho é feito de passos, os meus são os passos trôpegos e inseguros de uma criança, falta-me o domínio para caminhar de forma precisa, mas caminhar é preciso, viver não é preciso. O avião desceu em Delhi com 6 horas de atraso e cansado pude ver o contraste da Índia com a Istambul que deixei. Istambul, apesar do trânsito caótico é uma das grandes metrópoles do mundo, uma cidade muito desenvolvida e que, pela sua geografia privilegiada carrega o título de ser a única cidade situada em dois continentes: Europeu e Asiático e ainda é bela pelas encostas que margem o belo canal marítimo, pelos dezoitos palácios, pela cultura... Uma bela cidade, onde come-se bem, sobretudo os preciosos doces turcos, mistura de açucares, nozes, mel, e tudo o que a cultura turca acumulou ao longo de milhares de anos.

Falando em cultura, vale destacar o espetáculo de dança Derviches que assisti num centro tradicional turco, mais do que homens rodando, esta dança tem uma beleza estética e sua concepção está centrada em poesia, filosofia e mesmo física quântica. Toco o pé direito em solo indiano e meus olhos (também) infantis assistem uma Índia de ar seco, favelas, trânsito caótico, ruas sujas, buzinas e céu cinza. Um ônibus antigo atravessa entre buzinadas permanentes a cidade até o Ashram Aurobindo. Para quem, na sua ignorância imaginava um local tranquilo, cheio de natureza, a surpresa foi grande: o Ashram fica dentro da Cidade! Depois de me instalar e andar pelo Ashram, observar as pessoas, conversar com algumas delas, começo a perceber que está tudo certo, o que quer que procuro, se é que procuro, deve estar dentro de mim, não é o barulho, ou eventuais facilidades que ajudarão, ou dificultarão.

A briga é grande e interna e o oponente, um cara com anos de coisas impregnadas: cultura, medos, vaidades, expectativas, pensamentos, verdades, decepções, mentiras, desilusões, conquistas, desejos e conceitos. Nem tudo ruim, nem tudo bom. Percebo que tudo isto pode virar pó, o mesmo pó que encobre a poluída Delhi que meus olhos veem. Como uma criança de algumas dezenas de anos recomeço a aprender a andar, a ver, a comer. Segundo um amigo, a idade não existe pois você nunca tem 20, 35, ou 45 anos, nem mesmo 80. Tivemos 20, 35, 45 ou 80; tivemos, não temos mais, o tempo só faz sentido no presente, enquanto o vivemos; e no futuro, como uma expectativa de "presentes" a serem vividos. 

 

Assim na visão de meu amigo, o que verdadeiramente teríamos é o tempo que nos sobra, com o agravante e instigante fator de não sabermos se é muito ou pouco! Aliás, muito ou pouco para fazer o que? Se não sabemos, não temos como avaliar, Risos. Deixo as minhas divagações metafísicas e volto para a vida no Ashram, tudo simples e modesto, cama dura, quarto sem aquecimento, banho é de canequinha, comida de bandeja com uma única opção, cada pessoa deve lavar a sua bandeja e talheres, deve-se também arrumar a sua cama, secar o seu banheiro, lavar a sua roupa, enfim, coisas simples, como simples é a vida. Vamos deixando rolar, as coisas, a frase que me vem à cabeça é "a pele que me cobre a carne não tem planos" de Luiz Melodia.

 

 

Comentários

  • Adorei! Uma leitura din
    Laila Fidelli
    26/03/2021
Aguarde..